Foto: Arquivo pessoal

Nesta entrevista, mostramos a garra de uma mãe que trava uma luta diária em um país que não é o seu.

Por Paloma Chierici

Outro dia, em uma reunião, ouvi as mães presentes se desculpando pelo atraso, porque estavam sem o que nomearam de “rede de apoio”. Eu me perguntei mentalmente o que seria aquela expressão que eu ouvira pela primeira vez. Aproveitando que a reunião era on-line, não esperei muito e dei um google naquele mesmo momento.

Nessa pesquisa rápida, descobri a seguinte definição no site www.ninhosdobrasil.com.br: “Rede de apoio é aquele “pode contar comigo” verdadeiro. Essa frase, dita com sinceridade, seguida de uma ajuda – seja para brincar com o bebê um tempinho, seja para trazer um almoço – aquece nosso coração de mãe e pai e nos enche de esperança. Podemos contar com alguém! Não estamos sozinhos na tarefa de cuidar de um filho!”.

Confesso que realmente nunca havia escutado a expressão, mas entendi logo que é por uma “rede de apoio” que, muitas vezes, conseguimos realizar algo. Descobri que eu tenho a minha (gratidão Fabiana e Matheus). Se para uma mulher sem filhos como eu, ela se faz fundamental para que possamos realizar nossas atividades e nos realizar, para uma mãe, essa rede ganha uma importância muito maior.

Ainda com esse conceito na cabeça, encontrei, nas redes sociais, a história de uma brasileira, mãe solo e vítima de violência doméstica, criando seus dois filhos na Holanda. O primeiro que me veio à cabeça foi, será que ela tem uma rede de apoio para poder seguir adiante? Se já é difícil conseguir suporte em nosso próprio país, imagina no exterior….

Como amo conhecer e contar histórias, fui atrás dessa e aqui vos conto. Mariana Muniz é a mãe da Valentina e do Thomas. Ela se define como dona de casa e mãe em tempo integral. E, nos momentos nos quais consegue uma folga, dedica seu tempo a um centro de refugiados.

Procurando realizar seus sonhos, foi morar na Holanda, mas o que viveu não foi necessariamente um conto de fadas. Venha conferir a entrevista que fiz com ela, para perceber que uma mãe não se abate nunca. Com rede de apoio ou não, elas continuam com um único propósito: o melhor para o filhos!

Como você foi para a Holanda e por que decidiu ficar?

Eu estava passando por uma fase muito difícil no Brasil, então, decidi tentar uma vida em outro pais. Um dia, vi na televisão um programa sobre a Holanda e fiquei apaixonada e totalmente encantada. Decidi vir em uma quinta-feira, na outra terça-feira eu já estava pisando na Holanda, e isso há 05 anos. Logo após uns meses morando na Holanda, eu conheci o pai do meu filho mais novo, depois de uns meses namorando e morando juntos, eu engravidei. Tive o meu filho no Brasil, e depois voltei para a Holanda.

Você conta nas suas redes sociais que sofreu agressão doméstica. O que aconteceu e como foi viver isso fora do seu país?

Depois que voltei para a Holanda, comecei a sofrer violência por parte do meu ex-companheiro. No começo, foi muito sutil, com pequenas atitudes como: gritos, mentiras, pequenas ameaças, até chegar ao ponto de agressão física. Sofrer violência doméstica fora do seu pais é desesperador, você não tem uma rede de apoio, você não sabe seus direitos naquele país e normalmente o abusador usa ‘’seus filhos’’, dizendo coisas como ‘’você nunca vai voltar para o Brasil, porque seu filho é Holandês, então, eu retenho a autoridade parental sobre ele’’ – (leia o texto sobre as Mães de Haia para entender melhor – https://portalgama.com.br/quem-sao-as-maes-de-haia/ – ); ‘’você pode sair de casa, mas não vai levar o seu filho com você’’. Com isso, nós vamos ficando naquela situação, sem conseguir enxergar uma saída. Todas as vezes que chamei a polícia, basicamente eles me diziam que não podiam fazer muito por mim. Até que a minha ex-sogra me dizia que se eu chamasse a polícia mais uma vez, eles iriam tomar o filho de mim, e entregar para outra família. Então eu decidi me calar porque, entre ficar sem meu filho e apanhar, eu decidi continuar apanhando, já que, na minha cabeça, uma hora, algum dia alguém iria me salvar daquela situação.

Qual o suporte você teve aí? Teve alguma dificuldade por não ser holandesa?

Quando eu decidi sair de casa, basicamente saí com minhas coisas em sacolas de mercado, pois nem minhas malas o meu ex me deixou levar, e só saí com meu filho de casa. porque tive auxílio de uma advogada, pois meu ex chamou a polícia, dizendo que eu estava querendo sequestrar o meu próprio filho. Saí de casa sem dinheiro, e fui parar em Amsterdam, pois uma amiga foi me ‘’salvar’’ daquela situação. Então, fiquei uma semana sendo acolhida na casa de outras pessoas. Recebi muita ajuda por parte das pessoas que frequentam a Igreja católica de Amsterdam, elas me ajudaram com dinheiro para que eu pudesse me manter por uns dias, e lá conheci uma assistente social, à qual sou muito grata. Ela, junto a um assistente social do município que eu morava, colocou-me no abrigo de mulher, onde eu tive todo o suporte, financeiro, mental, com documentos, etc. No abrigo, vivem mulheres e crianças de várias nacionalidades, inclusive holandesas, e todo mundo é tratado exatamente igual.

Como mãe solo, qual apoio você recebe do governo holandês? Há alguma diferença entre sua filha brasileira e seu filho holandês?

Como mãe solo, eu recebo muito apoio do Governo Holandês, tenho ajuda de alguns benefícios, tenho uma assistência social que me ajuda com alguns assuntos que, por causa do idioma, eu às vezes tenho dificuldade em resolver. Também obtive ajuda para me realocar no mercado de trabalho. Eu tenho uma filha com nacionalidade Brasileira, e um filho com nacionalidade Holandesa, e não vejo que haja uma diferença entre eles em relação ao governo da Holanda, minha filha com nacionalidade brasileira tem os mesmos direitos que o meu filho com nacionalidade Holandesa.

Você já sofreu algum tipo de preconceito por ser mãe sola ou por ser brasileira?

Eu nunca sofri nenhum preconceito por ser mãe solo, aliás eu tive mais apoio do que eu esperava. Agora, preconceito por ser brasileira, isso todo dia a gente passa por uma situação seja ela pequena ou grande, às vezes, é um preconceito velado, mas ele está ali tinindo.

Como é sua relação com mães brasileiras e com as holandesas?

Por mais que pareça que não, eu sou uma pessoa muito fechada, apesar de ter minha rede social no Instagram ativa, eu tenho poucas amigas, e onde eu moro não conheço muitas brasileiras, então, o contato que tenho com mães da minha nacionalidade é basicamente através do Instagram, com trocas de experiências, dicas e afins. Já com as mães Holandesas, meu contato é maior, pelo fato de meus filhos estarem em idade escolar, com isso, quase todos os dias eles têm “playdates” na casa de alguém. Elas são bem abertas e receptivas, e respeitam nossas diferenças culturais (pelo menos as Holandesas que tenho contato, ‘risos’).

Do que mais sente falta estando longe da família?

O que mais sinto falta às vezes é uma rede de apoio familiar, isso realmente faz muita falta no dia a dia, onde eu moro no momento eu tenho ZERO rede de apoio seja ela de qual forma que for, então, não ter a minha família próximo realmente faz uma diferença principalmente se você está doente.

Você voltaria para o Brasil? Por quê?

Hoje em dia eu não voltaria a morar no Brasil, eu amo meu país, porém, as oportunidades que posso proporcionar para os meus filhos aqui são bem maiores. Aqui temos escolas gratuitas, plano de saúde para crianças de até 18 anos de idade gratuito, além do apoio à música e ao esporte, e claro, segurança. Então, por essas razões, mesmo sendo difícil ser sozinha em outro país, eu não voltaria para o Brasil para morar.

Qual dica você pode dar para uma mulher que esteja vivendo a situação que você viveu?

A dica que eu dou para mulheres que estão passando pela mesma situação que eu passei seria: se informem sobre seus direitos, pesquisem bem sobre leis e regras do país que vocês moram, não tenham medo de procurar ajuda, e não acreditem em tudo que as pessoas dizem. Muitas mulheres têm medo de sair da situação, porque acham que vão passar necessidade com seus filhos, e não é bem assim, para tudo tem uma saída e vocês não estão sozinhas. Existem vários abrigos de mulheres na Holanda e até mesmo em outros países, que podem te ajudar e dar suporte. Existem órgãos que podem te ajudar a sair do pesadelo que você está vivendo. O primeiro passo e ter a coragem de sair.

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